As eleições municipais de 2020, em que serão eleitos, ou reeleitos, vereadores e prefeitos em todo o país, ocorrem em um contexto de agravamento das questões climáticas, calamidades ambientais e sanitárias, especialmente a pandemia da COVID-19. Tal realidade expõe a sociedade e, em especial, os menos favorecidos economicamente a condições difíceis e, por vezes, agravadas pela falta ou pela má-informação.
Frente a isso, os Conselhos de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Sul (CAU/RS) e de Santa Catarina (CAU/SC), órgãos oficiais de fiscalização do exercício profissional, trazem uma posição técnica sobre diretrizes para qualificar a vida nas cidades. Atentos ao momento que vivemos, foi elaborado um Programa de Propostas, assertivas e concisas, referentes ao aprimoramento das políticas relacionadas ao direito à cidade e à gestão municipal.
A Carta às Candidatas e Candidatos tem a intenção de oferecer a parceria e a colaboração dos arquitetos e urbanistas, profissionais cuja formação técnica os qualifica para o apoio necessário ao alcance dos objetivos propostos neste documento. Nesse sentido, reafirmamos nossa disposição em colaborar, por meio de ações concretas de Arquitetura e Urbanismo, na construção de cidades mais sustentáveis, resilientes, inclusivas e promotoras do bem-estar social.
São temas interdependentes e complementares. Ainda que o Planejamento lide com incertezas e necessite constante revisão, seu objetivo é ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. A Gestão Urbana, desde que alinhada ao Planejamento, garante a sua
efetividade.
Orientamos sobre a necessidade de que TODAS as cidades tenham um Plano Diretor para que seu desenvolvimento seja SUSTENTÁVEL e para que sejam preservados e valorizados o seu PATRIMÔNIO AMBIENTAL E CULTURAL, integrados às seguintes diretrizes:
A) PLANEJAMENTO
• PARTICIPAÇÃO: Plano Diretor elaborado com a participação efetiva da população, na forma prevista no Estatuto das Cidades, com elaboração e revisão sob a responsabilidade técnica de um arquiteto e urbanista, com dados de cartografia e monitoramento de informações precisas, confiáveis e atualizadas;
• PLANOS SETORIAIS: os planos setoriais (ambiental, mobilidade, saneamento, etc.) devem ser articulados e integrados com o Plano Diretor;
• INTEGRAÇÃO ENTRE ÁREAS RURAIS E URBANAS: Planejar as áreas rurais e sua interface com a área urbana;
• OTIMIZAÇÃO DA INFRAESTRUTURA URBANA INSTALADA: através do uso de Parcelamento, Edificação e Utilização Compulsórios em vazios urbanos, visando o adensamento e evitando o espraiamento do Perímetro Urbano;
• USO MISTO: incentivar e prever uso misto (comércio, serviços e habitação) nos planos urbanísticos, assegurando a moradia próxima ao local de trabalho e serviços diversos, reduzindo percursos, economizando o custo da implementação e manutenção da infraestrutura e tempo de deslocamento;
• INCORPORAÇÃO: nos planos de governo, dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da ONU, que consiste numa agenda inclusiva objetivando o desenvolvimento sustentável.
B) GESTÃO PÚBLICA
• CONCURSO PÚBLICO para a contratação de projetos de obras públicas utilizando a modalidade “técnica e preço”, nos moldes já previstos na Lei Federal 8666/93;
• FISCALIZAÇÃO E MONITORAMENTO da implementação do planejamento urbano e ambiental (ocupações em áreas de preservação, venda de terrenos que não atendem ao regime urbanístico proposto,
etc);
• CONSÓRCIOS URBANOS INTERMUNICIPAIS para desenvolvimento de políticas de interesse comum,
como infraestrutura e meio ambiente.
A habitação é um direito de todo o cidadão e um dever do poder público. A Lei de Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social (ATHIS, Lei 11.888/2008) garante o DIREITO À HABITAÇÃO aos cidadãos de baixa renda. A ociosidade de edifícios abandonados e a periferização da moradia geram problemas graves ao funcionamento da cidade, tais como o transporte público e a segregação social. Seguem diretrizes:
• PLANO DE HABITAÇÃO que considere todo o território e que contemple além do acesso à moradia, o acesso ao transporte, ao trabalho, à educação e à cultura;
• ZONAS ESPECIAIS DE INTERESSE SOCIAL consideradas no planejamento com foco na Habitação de Interesse Social;
• DESTINAÇÃO DE VAZIOS URBANOS E ÁREAS SUBUTILIZADAS devem ser utilizadas como prioridade nos planos de habitação;
• APLICAÇÃO DOS INSTRUMENTOS CONTIDOS NA LEI 13.465/2017 (REURB) para a promoção do direito à moradia, conferindo segurança jurídica às posses exercidas para fins de moradia, especialmente por pessoas de baixa renda, e possibilitando a integração de assentamentos precários à cidade formal;
• APLICAÇÃO DOS INSTRUMENTOS CONTIDOS NA LEI ATHIS – 11.888/2008, a toda a família com renda de 0 a 3 salários mínimos tem direito à assistência técnica para habitação social;
• PROMOÇÃO DA SAÚDE E MELHORIA DA QUALIDADE DE VIDA DA POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA vinculada às políticas públicas de saúde pública, saneamento e regularização fundiária;
• CONSELHO MUNICIPAL DE HABITAÇÃO – Todo o município deve ter um Conselho Municipal de Habitação GARANTINDO OS MEIOS PARA O PLENO FUNCIONAMENTO DO PLANO DE HABITAÇÃO e a devida representação dos MOVIMENTOS POPULARES;
• FUNDO MUNICIPAL DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL ativo, cumprindo exigências legais para a gestão do referido fundo;
• GERAÇÃO DE EMPREGO E RENDA para os beneficiados pelas políticas de habitação de interesse social.
O espaço público é um lugar de convívio social, de manifestação política, de cidadania de cultura dos
municípios. A garantia de espaços públicos com os equipamentos adequados a cada particularidade,
dentro do contexto urbano, garantirá a cidadania e o bem-estar social.
• ACESSIBILIDADE assegurada a espaços e equipamentos públicos de maneira equilibrada e planejada, para as necessidades das comunidades e bairros;
• VALORIZAÇÃO DA IDENTIDADE qualificando os espaços públicos com mobiliário específico para cada público de cada comunidade ou bairro;
• POTENCIALIZAÇÃO DE ESPAÇOS PÚBLICOS EXISTENTES através da destinação de áreas e recursos para equipamentos de saúde, ensino e cultura como para ampliações de escolas, postos de saúde, poliesportivos e demais equipamentos;
• PROMOÇÃO DE ESPAÇOS PÚBLICOS SEGUROS através de estratégias como a facilitação de acessos, a visibilidade, a iluminação pública bem como com a promoção de atividades atrativas à população local, garantindo o seu uso frequente;
• CIDADE INCLUSIVA a partir da contemplação da perspectiva de gênero, dos idosos, de pessoas com deficiência, e de crianças nos espaços públicos a exemplo das CIDADES AMIGAS DA CRIANÇA (UNICEF) e da CARTILHA DE ESPAÇOS PÚBLICOS PARA TODAS E TODOS (UNOPS).
A mobilidade e o transporte público são elementos estruturadores da cidade. A correta integração num
sistema multimodal é muito importante para uma cidade sustentável, com menos poluição e outros
impactos ambientais; segura, com menos acidentes no trânsito, e inclusiva, acessível a mulheres,
crianças, idosos, deficientes, a todas e todos. Propomos as seguintes medidas:
• ELABORAR PLANO DE MOBILIDADE em coordenação com o Plano Diretor Urbano, considerando a
hierarquia da mobilidade urbana, modais de transporte e adequação à geografia da cidade (pela Lei
12.587/12, municípios com população superior a 20 mil habitantes são obrigados a elaborar esse plano
até 2021);
• GARANTIR A ACESSIBILIDADE A TODA A POPULAÇÃO, a exemplo do projeto “Cidade de 15 Minutos”, em
que todos os serviços necessários são acessados no tempo máximo de quinze minutos de caminhada;
• GARANTIR TRANSPORTE PÚBLICO EFICIENTE E DE QUALIDADE para toda a população, com especial
atenção às demandas das zonas periféricas da cidade;
• POTENCIALIZAR E PRIORIZAR A MOBILIDADE ATIVA (bicicleta e a pé), construindo mais ciclovias e
ciclofaixas, bem como melhorando a qualidade das calçadas de pedestres, considerando as normativas de acessibilidade universal;
• INVESTIR NA INOVAÇÃO E TECNOLOGIA para a humanização da cidade, priorizando o desenho urbano como ferramenta técnica para conseguir espaços para as pessoas. Regular e redistribuir o uso
do espaço público, reduzindo o espaço do carro e do estacionamento privado, em favor de modos
não-motorizados;
• PRIORIZAR O USO DE ENERGIA LIMPA e de baixo impacto ambiental no transporte público;
• De forma progressiva, INVESTIR NA IMPLEMENTAÇÃO DE SISTEMAS DE MOBILIDADE MULTIMODAL
como meio de atingir maior eficiência operacional e qualidade dos serviços. Exemplo: estimular a
eletromobilidade em sistemas de bicicletas compartilhadas;
Diante do quadro de ameaça aos recursos naturais dos municípios, a realidade dos desastres naturais
e a ameaça de pandemias, cada vez mais frequentes, afetam principalmente as populações mais vulneráveis. O Planejamento e Gestão Urbanos cuidam da distribuição e do acesso aos recursos básicos,
como saneamento, que determinam a saúde não apenas de uma população, mas também de um lugar.
Para a sustentabilidade ambiental, é necessário agir para o equilíbrio dos pilares ambiental, social e
econômico, através da aplicação de instrumentos capazes de regular o dito equilíbrio.
• ACESSO UNIVERSAL AO SANEAMENTO (Lei 11.445/2007: diretrizes nacionais para o saneamento básico e para a política federal de saneamento básico);
• PROMOÇÃO DA SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL, respeitando a capacidade de suporte e recursos ambientais limitados;
• PRIORIZAR A DIMENSÃO AMBIENTAL, considerando o potencial ambiental local e através de estratégias como a criação de corredores verdes, a destinação adequada de áreas de preservação ambiental e a criação de unidades de paisagem no planejamento urbano;
• PROMOVER AÇÕES DE ADAPTAÇÃO E MITIGAÇÃO ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS por meio do incentivo do uso de coberturas e paredes verdes, cisternas, ventilação e iluminação natural nas edificações; arborização, hortas urbanas, áreas verdes e permeáveis;
• PROMOVER A GESTÃO INTEGRADA do uso de recursos hídricos e uso do solo;
• PLANEJAR A CIDADE a partir de UNIDADES AMBIENTAIS, consideradas como base para o planejamento urbano na preservação e valorização dos recursos naturais locais;
• INCENTIVAR O USO DE ENERGIA LIMPA E DE BAIXO IMPACTO;
• PLANO PARA ÁREAS DE RISCO E VULNERABILIDADE;
• MINIMIZAÇÃO DA GERAÇÃO DE RESÍDUOS a partir de redução, do reuso e da reciclagem, além de uma política nacional de destinação de resíduos.
O município, através de seu patrimônio edificado e de sua paisagem cultural, relata sua história e
cultura. A valorização dos bens pertencentes à memória coletiva é tarefa imprescindível e, ao mesmo
tempo, complexa para a gestão municipal. Para a orientação, é fundamental contar com os órgãos de
preservação patrimonial das esferas federal e estadual.
• INSTITUIR POLÍTICAS E AÇÕES para garantir a preservação de bens culturais arquitetônicos, urbanísticos e da paisagem, com base nas Cartas Patrimoniais Internacionais e demais normatizações das esferas nacional, estadual e municipal;
• REALIZAR INVENTÁRIO DOS BENS CULTURAIS a serem preservados, respeitando e valorizando a identidade municipal;
• PROPOR E INCENTIVAR O REUSO, A REQUALIFICAÇÃO E A REVITALIZAÇÃO de áreas, edifícios e conjuntos em abandono que tenham valor cultural;
• Enfrentar o problema da EXISTÊNCIA DE IMÓVEIS DESOCUPADOS E ABANDONADOS, localizados em centros históricos, visando possibilidades de ativação/valorização econômica, através do consumo desses bens culturais;
• PROMOVER A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL aos estudantes e à população em geral, com inserção de atividades no currículo escolar e a partir de ações e programas específicos, respectivamente;
• REALIZAR POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO (indicamos a aplicação da norma ABNT NBR 14653-7:2009 – Conceitos, métodos e procedimentos gerais para os serviços técnicos de avaliação de bens do Patrimônio Histórico e Artístico).
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