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Profissão regulamentada desde 1985, técnicos industriais e agrícolas integravam o sistema Crea/Confea – o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia – da mesma forma que arquitetos e urbanistas, porém esses desde 1933.
Após décadas de luta pela autonomia da profissão, os arquitetos e urbanistas garantiram a criação de um Conselho próprio sob a Lei nº 12.378/2010 e a consequente saída do sistema Confea/CREAs.
Seguindo o exemplo da criação do CAU, em 2018 os técnicos de nível médio também tiveram sucesso na criação do CFT – Conselho Federal dos Técnicos Industriais, Lei nº 13.639/2018.
Ainda que em momentos diferentes, a consolidação de instituições específicas para cada profissão contribuiu positivamente para o fortalecimento de arquitetos e urbanistas, bem como de técnicos industriais, inclusive, em nosso caso, permitindo uma relação mais respeitosa e produtiva com o CREA/RS e seus profissionais.
“A defesa das atribuições é uma questão de segurança da sociedade, para combater a atividade de leigos que se aventuram sobre nossas atribuições e formação profissional. Não se pode avançar de maneira ilegal e irresponsável sobre profissões regulamentadas, que contam com formação universitária superior de cinco anos e com grades curriculares específicas que geram conhecimentos para os quais os profissionais terão formação e atribuição legal”, afirma o presidente do CAU/RS, Tiago Holzmann da Silva.
Atribuições específicas e a resolução conjunta
Antes mesmo da criação dos respectivos conselhos, as atribuições de todos os profissionais integrantes do Sistema Confea/CREA foram devidamente descritas em resolução conjunta em 2005, inclusive dos arquitetos e urbanistas e dos técnicos de nível médio. A Resolução Confea nº 1010/2005 dispõe sobre a regulamentação da atribuição de títulos profissionais, atividades, competências e caracterização do âmbito de atuação dos profissionais inseridos no Sistema Confea/Crea, para efeito de fiscalização do exercício profissional, e foi uma conquista conjunta de todos os profissionais abrigados naquele Conselho, naquele momento.
Esta Resolução foi resultado de um trabalho técnico, administrativo e jurídico extenso, aprofundado e transparente que resultou em um documento normativo completo que consolidou o acordo entre todas as profissões sobre as suas atribuições e áreas de atuação. Tanto que, a nossa legislação profissional – Lei 12.378/2010, reproduz em seu texto exatamente os termos da Resolução Confea nº 1010/2005, em respeito às normativas que já havíamos consolidado de forma conjunta no Conselho anterior.
Confirmando esse acordo, poucas semanas atrás, a Resolução Confea nº 1010/2005 foi citada como válida e referencial pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), em ação movida pelo CAU do Paraná que reivindicava que apenas profissionais de Arquitetura e Urbanismo fossem responsáveis técnicos pelos projetos de restauro em Patrimônio Histórico, coerente com nossa formação e legislação.
A decisão foi amplamente favorável, reforçando a jurisprudência de que os projetos e obras na área do patrimônio e do restauro devem ser conduzidas exclusivamente por profissionais devidamente habilitados para o serviço. Atividades como essa também podem ser encontradas nas Resoluções do CAU/BR nº 21 e nº 51, que reúne detalhadamente as atribuições da categoria, inclusive dispondo quais são compartilhadas ou não com outras profissões regulamentadas.
Vale lembrar que a Lei nº 12.378/2010 também deixa claro a necessidade de haver consenso entre CAU e outros conselhos profissionais caso haja controvérsia nas áreas de atuação. Os parágrafos 4º e 5º do Artigo 3º explicam:
- 4º Na hipótese de as normas do CAU/BR sobre o campo de atuação de arquitetos e urbanistas contradizerem normas de outro Conselho profissional, a controvérsia será resolvida por meio de resolução conjunta de ambos os conselhos.
- 5º Enquanto não editada a resolução conjunta de que trata o § 4º ou, em caso de impasse, até que seja resolvida a controvérsia, por arbitragem ou judicialmente, será aplicada a norma do Conselho que garanta ao profissional a maior margem de atuação.”
A decisão recente do STJ foi no sentido de reconhecer, agora judicialmente, que, enquanto não houver resolução conjunta dos conselhos envolvidos, considera Resolução Confea nº 1010/2005 como como pacificadora das atribuições entre todas as profissões anteriormente abrigadas no Confea.
A ilegalidade das Resoluções do CFT
O gerente Jurídico do CAU/RS, Alexandre Noal dos Santos, afirma que há ilegalidades nas Resoluções e demais atos normativos do Conselho Federal dos Técnicos Industriais.
“O CFT criou atribuições não previstas em lei, com invasão de competência específica da Presidência da República, prevista no art. 84, IV da CRFB/88. Existem afrontas, ainda, aos princípios constitucionais da reserva legal (art. 5º, II), da segurança jurídica e da legalidade (art. 37, caput)”, afirma Alexandre.
Como exemplo, ele afirma ser ilegal a Deliberação Plenária e a Resolução nº 108/2020 do CFT, que permitem regularização de edificações que ultrapassem o limite de 80m² e a possibilidade de os profissionais técnicos em edificações serem responsáveis pelos respectivos projetos. “Tal fato já foi objeto de ação judicial na Justiça Federal do Rio Grande do Sul, o Mandado de Segurança Coletivo sob o nº 5037655-74.2021.4.04.7100/RS, cujo desfecho foi no sentido de impedir os técnicos de realizarem regularização de edificações que ultrapassem o limite de 80m².” Ele cita a fundamentação da sentença da juíza federal Graziela Cristine Bundchen: “Há que se concluir, portanto, que o profissional capacitado a atestar a regularidade de uma obra somente seria aquele que estaria habilitado a projetar sua construção”, o que não é o caso dos técnicos em edificação. A sentença foi confirmada pelo TRF4.
O gerente jurídico do CAU/RS cita, ainda, as ilegalidades constantes da Resolução CFT n° 58, alterada pela Resolução CFT n° 108, as quais deveriam estar adstritas aos limites da Lei n° 5.524, de 1968, e do Decreto n° 90.922, de 1985. “Por exemplo, é ilegal o art. 2°, inciso II da Resolução CFT nº 58/2019, uma vez que é indevida a direção de obra e serviço por técnico em edificação, sendo esta atribuição exclusiva do arquiteto e urbanista ou engenheiro civil”, explica Alexandre.
Por fim, ele lembra sobre o disposto no art. 2°, inciso V da Resolução CFT nº 58/2019, que atribui aos técnicos a responsabilidade pela elaboração e execução de projetos, sem especificar se essas atividades estariam subsumidas aos limites da formação profissional.
“Em decorrência de tais ilegalidades, o CAU Brasil ajuizou Ação Civil Pública sob o número 10013638720214013400, em face do CFT. A Ação Judicial tramita na Justiça Federal de Brasília.”
Alertas à segurança da sociedade
O CAU/RS tem oficiado prefeituras de todo o estado a respeito dos limites de atuação de técnicos industriais. Um caso recente ocorreu em São Leopoldo, na Região Metropolitana de Porto Alegre, quando a prefeitura municipal questionou o Conselho se esses profissionais teriam habilitação para realizar a atividade de parcelamento do solo. A resposta por parte do CAU/RS foi negativa, justificada pela “ausência de atribuição legal e de estudos específicos acerca da matéria”.
Outra importante iniciativa foi a ação em conjunto com o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado do Rio Grande do Sul (CREA-RS) para barrar o Projeto de Lei Complementar nº 39/2020, que propõe a flexibilização da Lei Kiss e a possibilidade de técnicos de nível médio poderem atuar como responsáveis técnicos pela elaboração de projetos de prevenção contra incêndios. O autor do PL, deputado estadual Paparico Bacchi (PL), alegava a falta de profissionais habilitados disponíveis no mercado para atuarem, algo que não se sustenta na realidade.
Em nota à sociedade, amplamente divulgada, CAU/RS e CREA-RS em conjunto com diversas outras entidades profissionais da arquitetura e da engenharia, reforçam que “a competência e a técnica, quando colocam em risco a vida, só podem ser exercidas por quem possui formação profunda da matéria. Do contrário, a falsa percepção de competência (imperícia) é uma fagulha para grandes desastres, colocando em risco à sociedade gaúcha”.
Riscos envolvidos no trabalho leigo
Em janeiro de 2021, o CAU Brasil entrou com uma Ação Civil Pública contra o Conselho Federal dos Técnicos Industriais (CFT), a qual tramita na Justiça Federal de Brasília e, até o momento, ainda não foi proferida sentença.
Na petição inicial, o CAU Brasil defende que o CFT incorreu em flagrante ilegalidade por exorbitar o seu próprio poder regulamentador, isto é, criar normativas que permitem a realização de atividades que fogem à formação de técnicos industriais, desrespeitando o previsto pela já citada Resolução 1010.
O CAU Brasil considera que a profissão de Técnico Industrial de Nível Médio (TINM) deve ser exercida dentro dos limites da norma de regência de forma restrita, considerando a formação técnica do profissional inscrito no respectivo Conselho, “posto que conferem a esses profissionais, por ato normativo regulamentar e infralegal, competências e habilidades profissionais que, a par de extrapolarem as características e conteúdo da formação escolar, adentram no espectro de atribuições privativas dos arquitetos e urbanistas e de atribuições destes profissionais em compartilhamento apenas com engenheiros“.
O CAU/RS criou uma rotina especial de fiscalização para receber denúncias de colegas e consultas de instituições para apurar casos concretos de ilegalidades na invasão de competências e atribuições por pessoas sem formação acadêmica e não habilitadas legalmente.
“Técnicos em enfermagem não são enfermeiros, técnicos agrícolas não são agrônomos. Todos são profissionais necessários, complementares e parceiros nas respectivas áreas de atuação, mas não podemos admitir, em hipótese alguma, que esses jovens que realizaram seus cursos técnicos no contraturno do Ensino Médio sejam equiparados a profissionais com formação no Ensino Superior”, complementa o presidente do CAU/RS.