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Artigo do presidente do CAU/RS destaca a importância do projeto, a arquitetura como cultura e a construção do futuro em bases sólidas a partir de projetos completos
Construir hoje o patrimônio do futuro
Por trás de obras de qualidade existem grandes projetos. Edificações como a Fundação Iberê Camargo, o Auditório Araújo Vianna, o viaduto da Av. Borges de Medeiros e a revitalização da Orla do Gasômetro, em Porto Alegre, são exemplos que demonstram a relevância histórica e cultural da atuação do arquiteto e urbanista para as cidades e para as pessoas. Obras de qualidade, desde as grandiosas até as mais singelas e rotineiras, começam pelo desenvolvimento de um projeto completo, detalhado e orçado.
O projeto permite antever a solução do problema, é o planejamento da obra para garantir o atendimento de prazos, custos e características técnicas antes da execução da obra. Diversos autores e pesquisadores coincidem que um bom projeto é central e determinante para a qualidade das obras. Assim, um bom projeto não só encontra soluções para as necessidades e problemas como resulta em obras mais econômicas, seguras, duráveis e criativas, sem prejuízos ou desperdícios.
A legislação brasileira contempla a contratação de projetos de obras públicas por critérios de qualidade e técnica, mas ao mesmo tempo apresenta incoerências que levam a práticas de desvalorização de contratos e escolhas apenas pelo menor preço, como o Pregão. Ainda pior, o Regime Diferenciado de Contratações Públicas permite contratação integrada, ou seja, obra sem projeto, com transferência de responsabilidade e ausência de elementos de fiscalização. Projeto não é custo, é investimento em conforto, segurança, eficiência e beleza.
Nós, arquitetos e urbanistas e nossas entidades, acreditamos que o patrimônio cultural do futuro começa a ser construído hoje. Por isso, defendemos modalidades de contratações públicas que garantam a qualidade da obra entregue para a população. O Concurso Público de Projetos é uma alternativa, além de ser a modalidade preferencial prevista pela legislação para contratos de prestação de serviços técnicos por profissionais especializados, como arquitetos e urbanistas. O Concurso também é a forma mais ágil para licitações de projetos de Arquitetura e Complementares de Engenharia. Seu único critério de julgamento é a qualidade da solução proposta.
Arquitetura não é simples construção. Não se trata da maneira mais barata, mais rápida e mais ordinária de resolver um problema. François Mitterrand, presidente da França entre 1981 e 1995, inaugurou uma idade de ouro para a arquitetura pública francesa, ampliando o orçamento para a cultura, promovendo concursos de arquitetura nacionais e internacionais para as grandes “encomendas públicas” e investindo em instrumentos de conservação do patrimônio. A escolha da arquitetura para promover a cultura e provocar o desenvolvimento resultou em novos equipamentos culturais, museus, bibliotecas, assim como hospitais públicos e estações ferroviárias.
Louis Kahn, um dos mais importantes arquitetos do século 20, defendia que “até mesmo um tijolo quer ser alguma coisa” e referenciava sua arquitetura no respeito à natureza dos materiais e na simplicidade. O barro que vira tijolo se transforma em parede, que conforma um espaço, que assume função de abrigo, e finalmente alcança seu “desejo de ser alguma coisa”.
Este é o trabalho do arquiteto. Transformar tijolo em espaço, pedras em arcos, em pontes, em cidades. Do material bruto, libertar as formas belas e necessárias para as atividades humanas. Arquitetura é cultura quando avança, vai além da mera construção, resolve problemas com soluções completas, que funcionam, que satisfazem e que são belas.
O arquiteto e urbanista é o profissional que planeja, que entende e antecipa os problemas, que compara possibilidades, que pensa antes de agir e que, finalmente, projeta a melhor solução. Para que tenhamos espaços relevantes, duradouros e belos para nossas cidades e para o uso da população, é preciso entender a importância do projeto. Obras de qualidade só sairão do papel com qualidade se forem pensadas desde o primeiro traço a partir deste critério.
É possível solucionar problemas e atender necessidades de uso e construção de espaços e, ao mesmo tempo, criar arquitetura de referência, que agregue à paisagem, incentive o desenvolvimento econômico, represente ou construa a identidade de um lugar. Arquitetura transforma tijolo em cultura. O patrimônio de amanhã se constrói hoje.
Tiago Holzmann da Silva – Presidente do CAU/RS
15 de dezembro – Dia do Arquiteto e Urbanista
Artigo veiculado no jornal Correio do Povo em 15/12/2018